14/08/2020 – A perspectiva para utilização do diesel verde (HVO) e dos biocombustíveis de aviação no Brasil, nos próximos anos, reuniu especialistas para o debate no webinar “Biocombustíveis avançados: tecnologia e regulamentação”, realizado na manhã de quinta-feira, 13 de agosto. O seminário virtual fez parte da programação da primeira edição da Biodiesel Week, promovida pelo Ubrabio e a Embrapa Agroenergia.

Para discutir questões técnicas e regulatórias sobre os biocombustíveis e as perspectivas para a utilização deles pelo setor de aviação foram convidados especialistas da indústria, do governo e da área de pesquisa. Participaram do webinar: o superintendente de Biocombustíveis e Qualidade de Produtos da ANP, Carlos Orlando Enrique; a professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Amanda Gondim, coordenadora da Rede de Brasileira de Bioquerosene e Hidrocarbonetos Renováveis para Aviação (RBQAV); o consultor sênior para Combustíveis Alternativos e Sustentabilidade e comandante de aeronaves da Gol Linhas Aéreas, Pedro Scorza; o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Donato Aranda, consultor Técnico da Ubrabio; e o engenheiro mecânico Christian Wahnfried, da Divisão Powertrain Solutions da Bosch. A mediação dos debates coube ao professor Gonçalo Pereira, coordenador do Laboratório de Genômica e Bioenergia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Antes de dar início às apresentações temáticas, o moderador, professor Gonçalo Pereira (Unicamp), propôs que fossem explicadas as diferenças e definições dos diversos biocombustíveis que seriam tratados no webinar, tanto no que se refere às nomenclaturas quanto aos processos de produção.

A missão coube ao professor Donato Aranda, da UFRJ, que apresentou definições sobre biodiesel, diesel verde ou HVO (sigla em inglês para Hydrotreated Vegetable Oil), H-BIO e bioquerosene. O consultor técnico da Ubrabio esclareceu as diferenças entre cada produto e destacou que, no Brasil, a definição do biodiesel está regulamenta sob a forma de lei.

“O biodiesel é definido no Brasil e no mundo todo como um éster. No Brasil, existe a Lei 11.097, de 2005, que define o biodiesel como um biocombustível derivado de biomassa renovável para uso em motores a combustão interna, com ignição por compressão ou, conforme regulamento, para geração de outro tipo de energia, que possa substituir parcial ou totalmente combustível de origem fóssil. A mesma lei atribui à ANP a missão de especificar o biodiesel. Isso a ANP tem feito há 15 anos e define o biodiesel como o mundo todo o faz, ou seja, como combustível composto de alquil ésteres de ácidos carboxílicos de cadeia longa, produzido a partir da transesterificação e/ou esterificação de matérias graxas, de gorduras de origem vegetal ou animal”, explicou Aranda.

O professor Donato Aranda falou, também, sobre a utilização dos diferentes tipos de biocombustíveis. Aranda lembrou uma questão destacada pelo professor Paulo Suarez, da Universidade de Brasília, durante o webinar “Qualidade do biodiesel”, realizado na tarde de 12 de agosto. Na ocasião, o professor do Instituto de Química da UnB afirmou que o diesel verde está chegando para substituir o diesel fóssil e não para competir com o biodiesel.

Esse tipo de mistura ternária, isto é, composta por diesel de petróleo, biodiesel e diesel verde, é defendida pela Ubrabio no contexto de inserção do diesel verde na matriz de combustíveis, em uma visão de complementariedade e não de competitividade entre os combustíveis renováveis. “A ideia é que o diesel verde faça parte de uma mistura ternária com o diesel B, substituindo parte do percentual do diesel, e não do biodiesel”, explica Aranda.

Em relação ao HVO (diesel verde), que é o obtido a partir de óleos vegetais ou gordura animal tratados com hidrogênio, e é uma alternativa ao diesel fóssil, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis vem realizando uma série de ações para regulamentar esse novo produto.

“A ANP, após estudos internos e reuniões com os segmentos interessados, iniciou o processo de consulta e audiência públicas sobre a minuta de resolução que trata da especificação desse novo biocombustível e, assim, propiciar a sua futura comercialização no país. Esse é um primeiro passo, essencial para que o produto passe a ser produzido e comercializado no país”, explicou Carlos Orlando Enrique.

De acordo com o superintendente de Biocombustíveis e Qualidade de Produtos da ANP, o processo de consulta pública do novo biocombustível, iniciado em março, foi suspenso em função da pandemia. A consulta foi reaberta no dia 20 de julho e se estenderá até 2 de setembro, cumprindo assim o prazo de 45 dias.

Por conta do desenvolvimento desses novos biocombustíveis, laboratórios de montadoras têm se dedicado continuamente à realização de testes comparativos em relação ao desempenho dos diferentes combustíveis nos motores.

“O HVO tem características bastante específicas. A densidade do HVO é em torno de 7% mais baixa do que a do diesel. Essa densidade menor quer dizer que o diesel verde vai ter um conteúdo energético menor por volume. Então, se eu tenho uma densidade um pouco mais baixa eu vou ter um pouco menos de energia sendo colocada para dentro do cilindro do motor. Alguns ensaios em motores realizados por uma montadora demonstraram que a queda de potência está em torno de 5%, mas não é nada que seja perceptível pelo motorista”, explica o engenheiro mecânico Christian Wahnfried.

O engenheiro da Bosch explicou que a queda de potência é compensada pela redução do consumo. “O consumo apresenta uma queda de 2,5%, ou seja, o veículo perde um pouco de potência, mas consome menos combustível. Isso se deve ao fato de o poder calorífico do HVO que, em massa, é 5% maior do que o do diesel e, em volume, é 4% menor do que o do diesel. Então, as coisas acabam se equilibrando. A gente perde um pouco de potência, mas ganha em consumo”, explicou o engenheiro da Bosch.

Paralelamente aos trabalhos desenvolvidos pela indústria, os centros de pesquisa vêm estudando as tecnologias mais promissoras para fabricação de diesel verde, que pode ser produzido a partir de diferentes biomassas.

Biocombustíveis de aviação

A professora Amanda Gondim, da UFRN, destacou em sua apresentação questões técnicas como as diferentes rotas para produção do diesel verde e do bioquerosene de aviação. A pesquisadora também fez um panorama sobre a utilização do HVO e do BioQAV em outros países.

“Nos Estados Unidos, onde há um programa semelhante ao RenovaBio, a contribuição do diesel verde já vem sendo bem grande. Na Europa, o diesel verde e o BioQAV vêm crescendo 25%. Na Europa já está se falando em algum tipo de obrigatoriedade do uso do BioQAV em percentuais maiores”, explicou Amanda Gondim.

E quando o assunto são os combustíveis de aviação, é preciso lembrar que o setor aéreo foi um dos que sofreram maior impacto durante a pandemia da COVID 19. O segmento foi atingido em um momento em que vinha tendo um papel fundamental na regulamentação do biocombustível de aviação.

A retração do setor aéreo e a entrada de novas tecnologias nas aeronaves vão determinar uma redução do consumo de combustíveis pelo segmento. “Falando em consumo de combustíveis, estamos falando diretamente de emissões de gases de efeito estufa, da emissão de CO2, e é esse o grande desafio da indústria”, afirmou Pedro Scorza.

Segundo ele, a indústria da aviação entra na discussão da produção de biocombustíveis pelo fato de não ter alternativas, em médio e longo prazo, de uma capacidade de substituição de base tecnológica que reduza a pegada carbônica da indústria. “A alternativa é a substituição do querosene de origem fóssil por querosene de origem renovável”, explicou Pedro Scorza, que é também diretor de Renováveis para Aviação da Ubrabio.

Este e os demais webinars da Biodiesel Week podem ser consultados no canal da Ubrabio no YouTube.

Webinar Biocombustíveis avançados: tecnologia e regulamentação