Juan Diego Ferrés
Presidente da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio)

Marcelo Rodrigues de Oliveira
CEO da Ciapetro Distribuidora de Combustíveis

A venda das refinarias no modelo atual traz um risco real de formação de monopólios privados, pois a Petrobras está promovendo a venda não apenas das plantas e equipamentos de refino, mas de “cluster” de refino e logística, ou seja, de mercado consumidor na área de influência de cada parque de refino. O modelo adotado, não trará renda, não trará competição e concorrência, será um pedágio caro ao consumidor, com a venda do mercado sem ocorrer a tão sonhada concorrência.

Não propõe investimentos novos, senão mudança de propriedade apenas. Não acarreta ganhos de eficiência, nem ampliação do parque de refino.

Não se recomenda qualquer intervenção econômica no mercado pois a expectativa é que a venda das refinarias estimule investimentos em infraestrutura logística, públicos e privados. Existe um sentimento positivo com relação ao novo cenário pós‐venda das refinarias, porém ele gera incertezas principalmente quanto aos aspectos concorrenciais e à capacidade de atuação dos órgãos de controle, em que pese o bom preparo técnico destes.

O Congresso Nacional terá, em 2021, o dever de entregar à sociedade brasileira uma legislação completa sobre a produção, refino, comercialização, transporte e venda de combustíveis. É surpreendente que ainda não exista este marco legal para definir as regras de funcionamento de um segmento imprescindível para todos os setores da economia, do mega industrial ao entregador de pizza até pelo fato de parte dos acontecimentos mencionados no presente artigo já estarem acontecendo.

O Brasil é o sétimo mercado de combustíveis do mundo. Da produção ao posto de abastecimento, o setor de combustíveis representa entre 10% e 12% do Produto Interno Bruto (PIB), incluindo neste processo os biocombustíveis.

De tal modo, este marco legal passou a ser ainda mais urgente com a mudança no controle empresarial da principal estrutura de refino de derivados de petróleo do país. Trata-se da venda, já anunciada, de oito das doze refinarias da Petrobrás e previstas no plano de desinvestimento da estatal para o próximo ano. Uma mudança estrutural no mercado de refino de petróleo em uma das economias mais importantes do planeta.

Com estas privatizações, cerca de 50% do mercado de refino de petróleo serão repassados à iniciativa privada, nacional ou não.

A sociedade brasileira precisa entender como vai funcionar o setor o mercado de combustíveis em cada Estado ou região na nova configuração empresarial, e sua relação com produtores, importadores, distribuidores, postos de revenda e consumidores, além das vantagens comparativas de mercado que as novas indústrias terão. Adicionalmente, somente uma robusta legislação específica poderia garantir que as atividades das novas empresas focadas na produção de combustíveis fósseis, o façam estritamente em ambiente regulado que garanta os preceitos de sustentabilidade, controle ambiental, responsabilidades econômicas e concorrências inerentes à atividade, compatíveis com legislação específica para tal atividade, no sentido amplo.

Tal entendimento, deveria inclusive, regular, através desse novo arcabouço legal, o entrelaçamento desse setor de refino de petróleo junto aos demais setores, em especial dos biocombustíveis e a distribuição nas suas obrigações recíprocas de preservar o equilíbrio requerido do Carbono atmosférico do País e do cumprimento dos seus acordos globais, a preservação do meio ambiente, do correto funcionamento dos programas como o Renovabio, assim como reequilíbrio dos cumprimentos  dos “mandatos” de misturas obrigatórias de biocombustíveis adequando o modelo a experiencia internacional trazendo para o produtor primário de combustíveis fósseis a obrigação de arcar com os custos do Cbio, e, também as contribuições econômicas e da eficácia arrecadatória desses setores ao orçamento nacional, construindo um melhor ambiente concorrencial, sadio em todos os elos da cadeia.

Não bastará a Petrobrás vender suas estruturas físicas de refino e abandonar as atuais atribuições como empresa, desconsiderando seu papel de agente público exercido até agora. Será necessário que a legislação defina as obrigações das empresas que assumirem as refinarias da Petrobrás, do ponto de vista do mercado, ambiental e frente a consumidores finais, que vão desde o dono de um veículo de passeio até grandes siderúrgicas, indústrias e até usinas termoelétricas.

A venda dos ativos da Petrobrás também não pode ser simplesmente uma transferência do negócio para um novo dono ou uma troca de diretoria. Muito menos um repasse de uma cultura de benefícios e privilégios adquiridos no dia a dia da companhia que, desde que foi criada, na década de 1930, se confunde com a União, sem esquecermos, que se existiam benesses, também existiam ônus desse papel de “braço estatal”.

A nova configuração empresarial do parque industrial de refino, já no modelo privado exigirá regras claras, robustas e duradouras sobre o funcionamento deste mercado e sua relação com os distribuidores e postos de venda, especialmente com os biocombustíveis, hoje o principal instrumento do governo para cumprir as metas de descarbonização da matriz energética previstas em acordos internacionais e previstos no programa RenovaBio.

Para isto, Câmara e Senado precisam aprovar uma nova legislação rapidamente, para que a Presidência da República sancione e a regulamentação seja feita com instrumentos infralegais do ministério de Minas e Energia, Conselho Nacional de Política Energética e Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP). Tudo isso antes que as vendas sejam concretizadas.

De tão importante, este tema não deve ser tratado como de interesse exclusivo ou restrito da Petrobrás. É uma questão de segurança do abastecimento geral do país, do transporte e não apenas as regras para o refino de petróleo e o abastecimento de combustíveis. Tudo isso com reflexos no consumidor.

O que se percebe é a necessidade de adoção de critérios mais específicos para evitar a desorganização de um segmento com capacidade de comprometer todo o setor de combustíveis. O Setor de biocombustíveis e distribuição só podem apoiar e se comprometer com qualquer iniciativa que ressalte a importância que esse planejamento tenha ampliado o seu atual contexto de discussões, modelagem e adoção posterior, com amplo engajamento do Parlamento, no qual nos dispomos a dar as contribuições do próprio Setor. O Congresso, precisa debater e definir o seu modelo de produção, distribuição, venda de combustíveis e suas implicações no dia a dia do país no futuro.