Hoje, 16 de novembro, no contexto da 23ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 23), em Bonn, Alemanha, o Brasil e outros 18 países membros da Plataforma para o Biofuturo anunciaram uma visão ambiciosa para o papel dos biocombustíveis, da bioenergia e da bioeconomia moderna nas próximas décadas.

Conforme a Declaração de Visão adotada por esses 19 países, os biocombustíveis e a bioenergia de baixo carbono terão que multiplicar sua participação na matriz energética global até 2030, em particular no setor de transportes, sem o que, conforme indicam as projeções de agências internacionais, será impossível cumprir os objetivos do Acordo de Paris para a mudança do clima. E o compromisso assumido hoje pelos países da Biofuturo é o de buscar adotar as políticas públicas e outras medidas necessárias para que os investimentos correspondentes possam ocorrer.

Intitulado “Impulsionando a bioeconomia de baixo carbono: um desafio urgente e vital” (“Scaling-up the low carbon bioeconomy: an urgent and vital challenge”), o documento contém metas aspiracionais para 2030, bem como uma lista de ações e políticas sugeridas para o seu cumprimento. Os países que endossaram a declaração são, além do Brasil, Argentina, Canadá, China, Dinamarca, Egito, Filipinas, Finlândia, França, Índia, Indonésia, Itália, Marrocos, Moçambique, Países Baixos, Paraguai, Reino Unido, Suécia e Uruguai.

O anúncio do documento ocorreu durante o evento de alto nível “A Plataforma para o Biofuturo e a contribuição da bioenergia para o Acordo de Paris” (“Biofuture@COP23), organizado pelo governo brasileiro em parceria com o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE). O encontro, presidido pelo Ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, foi dedicado à atualização das atividades da Plataforma e à apresentação de iniciativas nacionais recentes no setor de bioenergia que são relevantes para o implementação do Acordo de Paris, como o RenovaBio, programa em elaboração pelo governo brasileiro que propõe uma política inovadora para os biocombustíveis de baixo carbono.

Lançada há um ano, em 16 de novembro de 2016, no segmento de alto nível da COP 22, em Marraquexe, por iniciativa do governo brasileiro, a Plataforma para o Biofuturo abrange alguns dos países mais relevantes, tanto para mercados e inovação como para biocombustíveis avançados e biomateriais, incluindo: Argentina, Brasil, Canadá, China, Dinamarca, Egito, Estados Unidos da América, Finlândia, França, Índia, Indonésia Itália, Marrocos, Moçambique, Países Baixos, Paraguai, Filipinas, Suécia, Reino Unido e Uruguai.

O Brasil, propositor original da iniciativa, atualmente desempenha o papel de facilitador interno da Plataforma, a cargo do Ministério das Relações Exteriores.

Informações adicionais estão disponíveis na página oficial da iniciativa: http://www.biofutureplatform.org/

DECLARAÇÃO DE VISÃO

“Impulsionando a bioeconomia de baixo carbono: um desafio urgente e vital”

Ministros e representantes de alto-nível da Argentina, Brasil, Canadá, China, Dinamarca, Egito, Filipinas, Finlândia, França, Índia, Indonésia, Itália, Marrocos, Moçambique, Países Baixos, Paraguai, Reino Unido, Suécia e Uruguai reuniram-se em 16 de novembro de 2017, em Bonn, Alemanha, e declararam o seguinte:

Contexto

1. O objetivo geral subjacente à conformação da Plataforma para o Biofuturo, lançada por nossos paí-ses há um ano em Marraquexe, é aumentar o uso de fontes de baixo carbono (i.e., biomassa sustentável) como matéria-prima para a produção de energia, produtos químicos e materiais. Num passado não muito distante, o mundo dependia quase inteiramente de recursos renováveis, incluindo biomassa, para alimenta-ção, energia e habitação. Pedimos que idealizem um futuro em que isso novamente seja verdadeiro – muitas necessidades modernas, incluindo plásticos, materiais de construção, roupas e, mais importante, energia, podem ser atendidas pela biomassa. Estima-se que, até 2050, metade dos produtos químicos e materiais poderiam ser produzidos a partir de recursos renováveis.

2. Em termos de energia, a necessidade é crítica. De acordo com análises recentemente atualizadas e cenários de longo prazo projetados por importantes agências internacionais – como a Agência Internacional de Energia (AIE) e a Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA) –, a bioenergia sustentável é um componente indispensável do conjunto necessário de medidas de baixo carbono, havendo elevado risco de não cumprimento dos objetivos climáticos de longo prazo sem sua contribuição. A bioenergia é fundamental em várias áreas, incluindo aquecimento e transportes, e particularmente em transporte pesado, marítimo e aéreo, em que opções práticas são escassas.

3. A fim de limitar o aumento da temperatura média global para níveis bem inferiores a 20 C acima dos níveis pré-industriais e prosseguir com os esforços para atingir 1,50 C, a participação da bioenergia e dos biocombustíveis na matriz energética global deve ser ampliada, de modo a, no mínimo, ser duplicada nos próximos 10 anos, mesmo assumindo-se níveis muito mais elevados de eficiência energética, altos níveis de eletrificação nos transportes e emprego de outras fontes de energia renovável. A bioenergia também pode reduzir outras formas de poluição atmosférica e ampliar a diversidade de fontes de energia e a segurança energética.

4. A bioeconomia expandida (definida, para fins desta Declaração, como um conjunto de atividades econômicas relacionadas à invenção, desenvolvimento, produção e uso de produtos e/ou processos biológicos para a produção de energia renovável, produtos químicos e materiais) deve basear-se em práticas sustentáveis, de modo a assegurar redução inequívoca nas emissões de carbono e evitar quaisquer outros impactos ambientais, sociais ou econômicos negativos. A realização desse potencial exigirá o desenvolvimento, comprovação e emprego de uma série de processos inovadores, bem como combustíveis e materiais que possam atender a exigentes padrões de desempenho, cumprindo rigorosos critérios de sustentabilidade. Uma bioeconomia sustentável expandida, respeitando a biodiversidade, também pode proporcionar benefícios ambientais, sociais e econômicos mais amplos, substituindo matérias-primas fósseis, criando empregos e promovendo o desenvolvimento regional, em linha com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

5. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a AIE Bioenergia e a IRENA, entre outros, defendem que impulsionar a bioeconomia de modo sustentável é possível, tendo em conta práticas agrícolas inteligentes, melhor utilização dos resíduos rurais e urbanos e políticas adequadas. Florestas, plantas e organismos marinhos convertem anualmente mais de 250 bilhões de toneladas de CO2 atmosférico em produtos potencialmente de alto valor. O papel da biomassa e dos produtos baseados na biomassa como um sumidouro de carbono a longo prazo, cujo potencial certamente existe, é reconhecido resguardado, mas sua concretização exigirá inovação e investimentos significativos, e seu cumprimento requererá colaboração contínua e ação coletiva.

6. Apesar desse crescente consenso, contudo, o emprego e os investimentos em bioenergia e bioprodutos não estão crescendo rápido o suficiente, ao passo que a tecnologia enfrenta uma série de obstáculos, incluindo desafios de escala em estágios iniciais, riscos financeiros, volatilidade dos preços de matérias-primas e incertezas políticas. É por esse motivo que a criação de condições para impulsionar a economia de baixo carbono é um desafio tanto urgente quanto vital.

Visão e Metas Aspiracionais

7. De acordo com as melhores projeções disponibilizadas por agências internacionais como a AIE e a IRENA, até 2030, será necessário um aumento generalizado na produção e no uso dos biocombustíveis sustentáveis e dos bioprodutos, incluindo a duplicação da contribuição da bioenergia moderna e sustentável na demanda final de energia e a triplicação do percentual de participação dos combustíveis sustentáveis de baixo carbono nos transportes, incluindo o transporte marítimo e aéreo.

8. Levando em conta essas projeções, nossos países estão determinados a indicar o caminho adiante, contribuindo, de acordo com suas próprias circunstâncias, políticas, metas e pontos de partida nacionais, para os seguintes objetivos aspiracionais coletivos para 2030:

• Aumentar significativamente a contribuição de bioenergia moderna e sustentável na demanda final de energia.
• Aumentar significativamente o percentual de participação dos biocombustíveis sustentáveis de baixo carbono nos combustíveis de transportes (incluindo o transporte marítimo e aéreo).
• Aumentar progressivamente os níveis médios de redução de emissões de carbono no ciclo de vida da produção de biocombustíveis em comparação com os combustíveis fósseis.
• Estimular a inovação na bioeconomia e o avanço comercial para a produção de biocombustíveis de baixo carbono em escala, de modo que seus custos se tornem amplamente competitivos em relação aos com-bustíveis fósseis quando o valor das reduções de emissões de carbono é levado em consideração.
• Aumentar significativamente os investimentos globais na bioeconomia sustentável de baixo carbono, incluindo em biorrefinarias avançadas e flexíveis, capazes de produzir energia e bioprodutos.
• Multiplicar os gastos dos governos e da indústria em pesquisa e inovação na bioeconomia.

Adoção de medidas

9. A concretização dessa visão inspiradora, mas também desafiadora, exigirá um esforço internacional coordenado envolvendo um amplo número de atores. Caberá a cada país individualmente, bem como aos demais atores interessados, explorar o potencial de possíveis ações e implementar uma estratégia, de acordo com suas circunstâncias. Será importante que os governos, em todos os níveis, assim como as instituições acadêmicas, a indústria e as instituições financeiras trabalhem conjuntamente para desenvolver um leque abrangente de ações a serem consideradas e para coletivamente abrir caminho para um futuro com menos emissões de carbono.

10. A adoção de medidas é urgente, e algumas ações, já em implementação por diferentes países e outros atores interessados e que podem servir como exemplos, incluem o seguinte:

Por governos:

• Implementar políticas, programas de apoio e arcabouços regulatórios que permitam o desenvolvimento e o emprego de biocombustíveis sustentáveis e bioprodutos. Exemplos de tais políticas – uma série delas já em implementação em países membros da Plataforma para o Biofuturo, de acordo com sua realidade e circunstâncias nacionais – incluem:

– Eliminação de subsídios ineficientes para a produção e uso de combustíveis fósseis;
– Introdução de regimes de precificação de carbono abrangendo uma ampla gama de setores energéticos e escalas de operação;
– Estabelecimento de metas específicas e/ou mandatos para o emprego de biocombustíveis nos transportes;
– Facilitação do desenvolvimento do mercado mediante compras governamentais ativas de biocombustíveis avançados e bioprodutos quando as especificações de desempenho forem alcançadas;
– Implementação de regimes específicos de incentivem as formas mais eficientes de bioenergia, diretamente relacionadas às suas reduções de emissão de carbono;
– Incorporação da bioeconomia de baixo carbono nas estratégias nacionais de economia circular em desenvolvimento, incluindo o uso de resíduos rurais e urbanos como matéria-prima;
– Estabelecimento de cadeias de valor integradas ligando uma ampla gama de indústrias e organizações de produtores de biomassa a usuários de bioprodutos e bioenergia;
– Promoção do comércio internacional de biocombustíveis mediante o estímulo a padrões de qualidade e sustentabilidade;
– Conceber e implementar arcabouços regulatórios e regulamentos de sustentabilidade práticos, fundamentados cientificamente, incluindo, entre outros mecanismos, avaliação do ciclo de vida (do poço à roda) e abordagens baseadas no risco;
– Viabilizar o desenvolvimento e comercialização de novos biocombustíveis sustentáveis e bioprodutos mediante políticas específicas voltadas para tecnologias em estágio inicial;
– Encorajar o uso de biomassa sólida em aplicações estacionárias eficientes, incluindo sistemas combinados de geração de calor e energia (CHP) e sistemas de aquecimento urbano, para prover energia à indústria e edificações;
– Implementar políticas agrícolas inteligentes para promover uma oferta sustentável, confiável e acessível de matéria-prima, incluindo a recuperação de terras degradadas e a proteção da biodiversidade, a introdução de rotações curtas e culturas energéticas perenes, reduzindo a perda e o desperdício, aperfeiçoando a coleta de resíduos e promovendo a intercalação de culturas e a agrossilvicultura;
– Aumento do apoio à pesquisa, desenvolvimento e demonstração para a bioeconomia de baixo carbono, incluindo em relação a produtos e produtos químicos novos, inovadores e economicamente eficientes derivados de biomassa;
– Estabeler ações colaborativas internacionais de capacitação, incluindo treinamento e incentivos para pesquisadores e estudantes.

Pela indústria:
• Aumentar investimentos em desenvolvimento e inovação voltados para a produção sustentável de equipamentos, componentes, processos e produtos finais de alta performance nos setores de ener-gia, materiais e produtos químicos, contribuindo para que se tornem competitivos em relação aos produtos fósseises quando os custos ambientais externos são levados em consideração.
• Tornar-se usuária de bioprodutos avançados quando especificações de desempenho e requisitos de sustentabilidade forem alcançados e os produtos forem competitivos, levando em consideração reduções de carbono e outros benefícios.

Pela comunidade financeira (incluindo instituições financeiras internacionais, bancos de desenvolvimento e instituições e fundos de financiamento privados):
• Aumentar a prioridade conferida a projetos de bioeconomia sustentável de baixo carbono como parte fundamental da carteira de investimentos em energia renovável, mitigação das mudanças climáticas e projetos de financiamento “verde”, aumentando consideravelmente os recursos disponíveis.
• Empregar garantias de empréstimos e outros instrumentos financeiros para facilitar o desenvolvimento, produção e emprego de combustíveis de baixo carbono e bioprodutos.

Pela comunidade científica:
• Conduzir pesquisas de alta qualidade em bioprodutos e bioprocessos novos e/ou aperfeiçoados e em sistemas de conversão e utilização otimizados para bioenergia.
• Fornecer evidências e análises de alta qualidade relacionadas à sustentabilidade da bioenergia e dos bioprodutos, de modo a aumentar a confiança e o consenso público.
• Proporcionar aconselhamento técnico para apoiar a elaboração de políticas públicas para a bioeconomia.

11. O papel da Plataforma para o Biofuturo, em colaboração com organizações e iniciativas internacionais tais como as mencionadas em sua Declaração de Lançamento, é proporcionar um foro para apoiar esse esforço colaborativo e auxiliar a monitorar os progressos alcançados na consecução dessa visão. Na sequência da presente Declaração de Visão, a Plataforma para o Biofuturo realizará uma análise detalhada, utilizando dados recentes e relatórios de agências e iniciativas internacionais, estratégias nacionais e contribuições como o relatório da Plataforma para o Biofuturo sobre o Estado da Bioeconomia de Baixo Carbono, com vistas a: a) trabalhar na elaboração de objetivos mais específicos; b) elaborar um plano de ação com iniciativas detalhadas para apoiar a consecução desses objetivos; e c) desenvolve um mecanismo de comunicação para acompanhamento dos progressos alcançados.

Fonte: Itamaraty