Arrasado pelos escândalos que levaram a ameaças de proibição, o diesel virou o bicho-papão da indústria automobilística. Conforme se aproxima o segundo aniversário do “dieselgate”, o mercado se questiona se o combustível escolhido por milhões de motoristas europeus realmente está com os dias contados.

“Ao longo de vários meses, nós vimos uma queda líquida nas vendas de diesel nos principais mercados europeus, França e Alemanha”, disse o especialista da indústria Stefan Bratzel, do Centro para Gerenciamento Automobilístico da Alemanha.

No país, o diesel hoje representa 37,7% dos novos carros vendidos, queda de 45% ante o ano anterior.

Na França, a parcela de veículos movidos a diesel caiu para baixo dos 50% pela primeira vez desde 2000, a 47,8%.

Em 18 de setembro de 2015, no auge do Salão do Automóvel de Frankfurt (IAA), o diesel entrou em trajetória descendente, quando autoridades reguladores americanas revelaram que a Volkwagen tinha usado um software para manipular teste de emissões de motores a diesel.

A controvérsia avançou e envolveu outras gigantes automobilísticas, destruindo o mito do “diesel limpo” e afastando consumidores.

Conforme o evento bienal se prepara para abrir suas portas novamente nesta semana, incertezas sobre o futuro da tecnologia lançam uma sombra sobre a vitrine da indústria.

‘Morte lenta’

“O dieselgate levou o diesel a um beco sem saída”, acredita Ferdinand Dudenhoeffer, diretor do centro de pesquisa CAR da Alemanha. “Ele vai ter uma morte lenta”, decretou à AFP.

Outros especialistas, contudo, são contrários a declarar a morte do combustível tão cedo.

 

Milhões de carros movidos a diesel estão em circulação, comprados de boa-fé antes do escândalo vir à tona, e políticos se esforçaram para ressaltar que os motoristas não terão que pagar pelos delitos da indústria.

“Você não pode esperar que as famílias substituam seus carros por outros de energia limpa de um dia para o outro”, afirmou o analista da Euler Hermes, Maxime Lemerle.

“Ninguém pode ganhar com uma mudança abrupta”.

Não por acaso, a depreciação mais brusca do diesel foi na Europa.

Um dos melhores argumentos para comprar um veículo a diesel, que é que ele é mais eficiente que o petróleo, nunca chegou a influenciar muito os motoristas dos Estados Unidos, acostumados aos preços baixos de combustível.

A China, o maior mercado mundial de carros, até então apostou em motores mais ambientalmente corretos, e planeja estabelecer cotas de veículos elétricos que prometem abalar a indústria.

Mas os fabricantes da Europa, apoiados por governantes desesperados para enfrentar o aquecimento global, investiram pesado na tecnologia a diesel por anos, promovendo-o como um combustível mais eficiente e ambientalmente correto que a gasolina, por causa das emissões de dióxido de carbono mais baixas.

Contudo, o “dieselgate” revelou o quanto a indústria estava disposta a driblar as regras, ou trapacear, para encobrir que a tecnologia estava emitindo bem mais óxido de nitrogênio (NOx) que o autorizado legalmente.

Os gases NOx aumentam a poluição e foram ligados a doenças como asma, câncer de pulmão e cardiopatias.

Mais limpo, com custo

A Comissão Europeia respondeu à manipulação estabelecendo novos testes de emissões mais rigorosos em 1º de setembro, que vão forçar fabricantes a fazerem um trabalho melhor para filtrar os poluentes prejudiciais dos motores a diesel – algo complexo, que é tecnicamente possível, mas dispendioso.

“Nós sabemos como remover a poluição de um motor a diesel, sabemos como torná-lo limpo. Mas isso tem um preço”, disse Patrick Koller, CEO do fornecedora de equipamentos automobilísticos francesa Faurecia.

Marc Mechai, um especialista da Accenture em Paris, estima o custo em cerca de “1.500 euros por carro” para fazer o motor cumprir as regras mais rigorosas. “Para carros mais baratos que 20 mil euros, isso torna o uso do motor a diesel difícil de se justificar”, acrescentou.

Além disso, os governos de diversos países também estão se esforçando para combater a poluição e atingir as metas estabelecidas no Acordo de Paris.

França e Reino Unido anunciaram planos de proibir a venda de novos veículos a diesel ou gasolina até 2040.

A China já anunciou intenções similares, e dezenas de cidades na Alemanha têm a mesma preocupação.

Na Alemanha, onde o motor a diesel foi inventado, a chanceler Angela Merkel está se equilibrando entre expressar sua solidariedade aos motoristas enganados e agradar o setor, que emprega mais de 800 mil pessoas no país.