O preço de referência global do petróleo atingiu sua máxima em quatro anos nesta segunda-feira (24). Mas os dias de preocupação com a oscilação do valor do combustível estão contados, segundo estudo da Carbon Tracker.
A consultoria calcula que a energia gerada por combustíveis fósseis no mundo deverá atingir seu pico máximo em 2023. A partir daí, passará a cair e dar lugar a fontes renováveis.
A transição é resultado, principalmente, de ganhos de eficiência energética (que vão reduzir o consumo total)e do barateamento das fontes renováveis (como a eólica e a solar), que nos últimos anos se tornaram competitivas em relação às fontes de origem fóssil.
Segundo o relatório, esse pico de consumo poderá variar entre 2020 e 2030 —a depender do ritmo de expansão das fontes renováveis e do crescimento da economia global.
A consultoria aponta quatro fases nesse processo: a primeira, que estaríamos vivendo atualmente, é a da inovação. Em seguida, vem o pico.
A partir de 2030, o cenário se inverteria: as fontes renováveis superariam as fósseis, e a mudança passaria a ser mais rápida até que, em 2050, na última etapa, mais de 50% da demanda global passaria a ser atendida por fontes limpas.
A essa altura, não apenas a geração elétrica terá sofrido uma mudança radical, mas também o consumo industrial (onde os combustíveis são usados, por exemplo, para aquecimento) e o transporte (com a expansão dos veículos elétricos), prevê o estudo.
Esse cenário já leva em consideração uma das principais limitações apontadas por especialistas à expansão das fontes eólica e solar: o fato de que são intermitentes —ou seja, dependem da disponibilidade de sol e dos ventos, que não são constantes.
Para Kingsmill Bond, analista da Carbon Tracker, isso só passará a ser um problema mais para frente, quando o consumo dos combustíveis fósseis já estiver em uma curva descendente. Ele diz que há uma tolerância mínima a essa intermitência.
“É possível ter até 20% da matriz elétrica com fontes intermitentes sem que haja problemas. O pico dos combustíveis fósseis vai acontecer quando a penetração das energias renováveis no mundo for de 14%, antes desse limite ser atingido”, afirma.
No entanto, esse movimento pode variar a depender do contexto regional.
No Brasil, por exemplo, há um risco de que essa transição provoque um efeito reverso, ou seja, provoque o aumento dos combustíveis fósseis e não sua queda, alerta Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil.
O motivo é que o país parou de investir em grandes hidrelétricas (principal fonte de energia no Brasil) e passou a priorizar outras fontes, como a eólica e a solar.
Para compensar a volatilidade dessas usinas movidas a ventos e sol, o país está colocando suas fichas nas usinas térmicas movidas a gás natural como forma de dar estabilidade ao sistema —e não nas hidrelétricas.
O resultado é que o consumo de combustíveis fósseis, que sempre foi menor no Brasil do que em outros países, pode ganhar força nos próximos anos, diz Sales.
“Hoje há uma rejeição grande às hidrelétricas, por questões ambientais, indígenas. O Brasil ainda tem 150 MW de potencial para novas usinas desse tipo. Mais de 60 MW estão em reservas indígenas [o que torna as obras pouco prováveis], mas há um tanto que não está e que poderia ser perseguido”, afirma.
A transição para as fontes renováveis também deverá trazer um risco sistêmico ao setor de óleo e gás no longo prazo, que atualmente detém ativos que somam US$ 25 trilhões, segundo o estudo.
Para Bond, caberá às companhias acompanhar as inovações do mercado para garantir sua sobrevivência —movimento que já está em curso.
No último ano, têm crescido os anúncios de petroleiras que decidem investir em fontes renováveis, como usinas eólicas em alto-mar.
É o caso de gigantes do setor, como a anglo-holandesa Shell, a norueguesa Statoil e a francesa Total.
Algumas das empresas já anunciaram inclusive o interesse de investir nesse segmento dentro do Brasil —onde o potencial eólico é grande. A própria Petrobras tem buscado iniciativas nesse sentido.
O esforço pode mais que dobrar a participação da energia eólica e solar na matriz energética do Brasil até 2026, para 18%, segundo a EPE (Empresa de Pesquisa Energética).
Fonte: Folha de S.Paulo