Do DNA ao aproveitamento de resíduos, o dendê é objeto de estudo em várias áreas de trabalho da Embrapa em conjunto com seus parceiros. O interesse dos pesquisadores pela palmeira está na alta produtividade de óleo, que pode chegar a 6.000 quilos por hectare (kg/ha). A planta tem sido apontada como principal alternativa para aumentar a participação da região Norte do país no Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel, bem como para diversificar as matérias-primas para esse biocombustível. Atualmente, mais de 80% do óleo utilizado na produção de biodiesel vem da soja, que produz cerca de 550 kg de óleo/ha.

Há que se considerar também a necessidade de um maior volume de óleos para atender ao crescimento da demanda por biodiesel. Só nos últimos doze anos, a frota brasileira de automóveis aumentou 150%. Além disso, o governo estuda aumentar de 5% para 10% ou mais a adição do biocombustível ao óleo diesel. Soma-se a isso a necessidade de matéria-prima para o mercado de biocombustíveis de aviação, que começa a despontar.

Contudo, “para que o dendê possa ganhar uma fatia maior nos gráficos que apresentam a participação das diferentes matérias-primas na fabricação de biodiesel, será preciso aumentar significativamente a produção brasileira dessa palmeira”, pondera o chefe-geral da Embrapa Agroenergia, Manoel Teixeira Souza Júnior. Atualmente, o País importa aproximadamente 60% do óleo de dendê que consome. Terras disponíveis existem. O zoneamento realizado pela Embrapa identificou mais de 30 milhões de hectares de terras fora de áreas protegidas que são aptas para o cultivo.

Barreiras

A expansão, no entanto, depende do aumento de oferta de sementes de variedades de alta qualidade genética desenvolvidas especialmente para o Brasil. Com objetivo de avançar nesta área, a Embrapa Agroenergia tem usado recursos como a Genômica, a Fenômica e a Metabolômica para construir uma base de dados que dê suporte aos programas de melhoramento genético da cultura, que são desenvolvidos principalmente nas unidades Amazônia Ocidental e Oriental. O trabalho está focado não só no dendê, mas também no caiaué.

Enquanto o dendê tem origem africana, o caiaué é nativo das Américas. A característica dessa espécie que tem despertado a atenção dos pesquisadores é a resistência ao amarelecimento fatal, principal doença que acomete o dendê, cuja causa é ainda desconhecida apesar de ser buscada há mais de 20 anos. A Embrapa já desenvolveu um híbrido interespecífico entre o caiaué e o dendê, o BRS Manicoré. Além de ser resistente ao amarelecimento fatal, ele possui produção de cachos e óleo bastante próxima ao dendê – quando a polinização assistida é realizada.

Apesar da importância que tem para os programas de melhoramento, pouco se conhece sobre a diversidade genética do caiaué. Por isso, a Embrapa Agroenergia extraiu o DNA de amostras de folhas dos mais de 200 acessos pertencentes ao Banco Ativo de Germoplasma (BAG) de caiaué da Embrapa Amazônia Ocidental, a fim de realizar um amplo estudo de diversidade baseado na aplicação de marcadores moleculares. “Conhecer a diversidade genética do caiaué é fundamental para otimizar os programas de melhoramento do dendê e o desenvolvimento de novos híbridos entre as duas espécies”, afirma o pesquisador Alexandre Alonso, da Embrapa Agroenergia.

Genoma

Além de contribuir na elucidação da diversidade genética do caiaué, a Embrapa Agroenergia também está criando um grande banco de dados genômicos. O primeiro trabalho foi reestimar o tamanho do genoma de espécies do gênero Elaeis, ao qual pertencem tanto o dendê quanto caiaué, por meio de citometria de fluxo. Os resultados deste trabalho demonstraram que os genomas das espécies são similares em tamanho e que, de fato, o do caiaué é ligeiramente maior. “Esse grande banco de dados genômicos que estamos criando servirá de base posteriormente para a descoberta e validação de genes de interesse e marcadores moleculares para utilizarmos nos programa de melhoramento”, ressalta Alonso. Em paralelo, uma planta de caiaué foi totalmente sequenciada, o que resultou em uma montagem inicial para este genótipo na qual a Embrapa esta trabalhando. Nos próximos anos a “Embrapa Agroenergia, em conjunto com outras unidades parceiras, vai publicar o draft do genoma de Elaeis oleifera, incluindo a descrição dos genes da espécie”, adianta o pesquisador.

Amostras de folhas de dendezeiros também estão sendo estudadas utilizando duas técnicas avançadas: a Metabolômica e a Metagenômica. Por meio da primeira delas, é possível identificar e quantificar os metabólitos de um organismo, o que permite a definição de alvos para o melhoramento genético. “Atualmente, a equipe está desenvolvendo um protocolo de extração eficiente para os metabólitos majoritários presentes em folhas de dendê, aperfeiçoando as condições desde colheita, moagem e secagem do material, extração com solventes, até armazenamento do extrato, para preservar os metabólitos presentes na folha sem que haja degradação química”, conta a pesquisadora Patrícia Abdelnur, também da Embrapa Agroenergia.

A Metagenômica, por sua vez, está sendo empregada com o objetivo de estudar os microrganismos presentes no solo associado a essas plantas e identificar possíveis agentes causadores do amarelecimento fatal. Com as ferramentas metagenômicas, os cientistas conseguem isolar genes de microrganismos mesmo sem cultivá-los. A pesquisadora Betânia Quirino explica que isso é importante porque apenas 1% dos microrganismos é cultivável. “Com essa ferramenta que estamos utilizando, podemos explorar toda a diversidade metabólica dos microrganismos presentes no solo”, diz. Os microrganismos encontrados também serão analisados quanto à sua capacidade de produzir insumos para a produção de etanol celulósico – produzido a partir de bagaço de cana, capins, resíduos florestais etc.

Biodiesel e aproveitamento de resíduos

A equipe da Embrapa Agroenergia dedicada à pesquisa de processos para a obtenção de produtos agroenergéticos está estudando a produção de biodiesel a partir do óleo de dendê. De acordo com a pesquisadora Itânia Soares, esse óleo normalmente apresenta uma acidez maior do que o óleo de soja. Por causa disso, as condições para a reação química que produz o biodiesel (a transesterificação) são diferentes, o que implica a necessidade de ajustes. “Nossos estudos visam à redução de custos, etapas e geração de efluentes na produção do biodiesel de palma”, especifica. O desenvolvimento de metodologia de controle de qualidade da mistura diesel/biodiesel de palma é outro objetivo das pesquisas.

Pensando no aproveitamento máximo da biomassa proveniente do dendê, também estão sendo estudados usos para os cachos vazios, chamados de engaços. Para cada tonelada de óleo de dendê, é gerada cerca de 1,1 tonelada desse resíduo. O aproveitamento dele agregaria valor à cadeia produtiva e evitaria que eles se tornassem um passivo ambiental. Na opinião do pesquisador Leonardo Valadares, “a utilização integral do dendê é essencial para a sustentabilidade do negócio”.

Os engaços são ricos em celulose. O trabalho da Embrapa consiste justamente em extrair deles nanofibras de celulose, que podem ter vários usos, entre eles produção de papel e reforço da borracha natural. “A celulose é um material biodegradável e com propriedades que a tornam útil em diversas aplicações”, destaca Valadares.

Outro resíduo que a Embrapa Agronergia vai estudar é o POME, um efluente gerado no processo de extração do óleo. Rico em nutriente, atualmente ele é utilizado na fertirrigação dos dendezais. Com o trabalho que vai desenvolver, o centro pretende encontrar alternativas de uso para o efluente.