Artigo publicado no site Congresso em Foco em 2009.
Biodiesel Metropolitano: uma questão de saúde pública
*Juan Diego Ferrés
No próximo dia 1º de julho, começa a vigorar o B4, ou seja, passa a ser obrigatória a adição de 4% de biodiesel ao óleo diesel de petróleo utilizado nos 35 mil postos de abastecimento do Brasil. A medida inaugura uma nova fase do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB), promovendo ganhos ambientais, de saúde e econômicos ao nosso país e ao povo brasileiro.
O B4 chega num momento importante, onde muitos especialistas apontam para o ”início do fim da era do petróleo”. Três dos mais renomados peritos do setor avaliam que o auge da produção mundial daquele combustível pode ter começado em 2006 ou acontecerá até 2010. As previsões apontam para a produção de 20 bilhões de barris em 2030, contra uma demanda de 40 bilhões, consolidando um déficit no fornecimento de cerca de 50%.
Seja pelo esgotamento das reservas ou pelos custos de exploração das fontes remanescentes, o uso do petróleo representará sinais de grandes problemas econômicos para uma civilização que depende deste recurso para atividades essenciais, como produção de energia elétrica, agricultura e transporte.
Diante de quadro tão negativo, a busca por novas alternativas energéticas torna-se uma obsessão mundial. Vários países já desenvolvem programas de biocombustíveis, com destaque para os da Europa, Ásia e América.
O Brasil já é um dos que mais utiliza recursos renováveis para geração de energia. Nossa matriz energética é composta por 45% desses recursos, entre biomassa e hidroeletricidade.
Mas este índice ainda pode ser muito melhorado com o uso do biodiesel. Futuramente, pode-se substituir totalmente ou em partes a utilização do óleo diesel, principal combustível consumido no país (45 bilhões de litros por ano).
Esta também é uma das razões da comemoração do B4. Dados do Ministério de Minas e Energia mostram que em 2008 o biodiesel evitou a importação de 1,1 bilhão de litros do diesel de petróleo – ganho de US$ 976 milhões na balança comercial. Mesmo assim, a importação cresceu 36% em relação a 2007, e custou ao país US 4,9 bilhões.
O Setor já tem capacidade para assumir o B5 e outros usos. Hoje, temos alto índice de ociosidade, o que deve ser evitado numa indústria nova. É importante reduzir a disparidade entre capacidade de produção e demanda. Maior produção de biodiesel significa geração de empregos e renda em toda a cadeia produtiva. E tem impacto positivo na balança comercial, pela redução da importação do diesel.
Outra abordagem importante é a agricultura familiar. O fortalecimento desta atividade é ponto central no PNPB e questão estratégica econômica e socialmente para o país.
Em 2007, cerca de 40 mil agricultores familiares venderam oleaginosas para as indústrias de biocombustíveis, 20% do total produzido. O potencial é enorme e este número poder crescer muito nos próximos anos.
Outro aspecto atacado por muitos foi a questão da segurança alimentar. Mas os números derrubam essa crítica.
A Embrapa avaliou o potencial brasileiro na produção de oleaginosas, adotando como critério a não-expansão da fronteira agrícola e a integral preservação da floresta amazônica. Segundo a pesquisa, o Brasil é capaz de produzir 60 bilhões de litros de biodiesel. O suficiente para substituir todo o óleo diesel consumido no país e gerar um excedente de 20 bilhões de litros.
Um exemplo de que não existe relação antagônica entre alimentos e agroenergia é a cana-de-açúcar. Embora a produção tenha crescido 400% em 31 anos, de 100 milhões de toneladas em 1976 para 500 milhões em 2007, a cultura de alimentos não registrou queda e sim safra recorde de grãos entre 2007/2008, com mais de 140 milhões de toneladas.
Temos ainda o exemplo do girassol. Cultivado antes ou após a safra principal, enriquece o solo de nutrientes, favorecendo as culturas subsequentes.
Além dessas vantagens, o biodiesel é um combustível limpo, com inúmeros ganhos ambientais. E é aqui que a União Brasileira do Biodiesel (Ubrabio) levanta a bandeira do Biodiesel Metropolitano.
A resolução nº 403/08 do Conama estabelece a redução das taxas de enxofre do diesel comercializado no país. A nova regra vai beneficiar muito nosso meio ambiente.
A regulamentação atual permite teores de até 500 ppm (partes por milhão) no diesel comercializado em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e em mais de 200 outras cidades. No resto do país, as taxas vão até dois mil ppm. A decisão do Conama é pela adoção do S10, reduzindo o teor de enxofre para o máximo de 10 ppm.
O diesel com baixo teor de enxofre possui menor capacidade de lubrificação. Característica já declarada pelos fabricantes como não compatível aos veículos nacionais. Entretanto, sabemos que o biodiesel aumenta a lubricidade, evidenciando a necessidade de elevar o percentual do mesmo.
Assim, é imprescindível associar à pauta de discussões acerca da implantação do S10 a adoção do Biodiesel Metropolitano, pois, além de ajudar no processo de redução do percentual de enxofre, por meio da recomposição da capacidade lubrificante, são eficazes em diminuir a emissão de vários outros gases poluentes.
Estes materiais, lançados ao ar todos os dias, principalmente nas regiões metropolitanas, além de causar sérios danos ao meio ambiente, como o agravamento do efeito estufa, por exemplo, são também uma questão de saúde pública. Quem mora nos grandes centros urbanos pode atestar isto.
Os biocombustíveis reduzem significativamente a emissão de hidrocarbonetos, que aumentam a incidência de câncer nos pulmões e provocam irritação nos olhos, nariz, pele e aparelho respiratório. Diminuem também o monóxido de carbono, causador de restrição na oxigenação do sangue, levando a tonturas, vertigens e alterações no sistema nervoso central. Suprimem ainda a circulação do material particulado, que piora os quadros alérgicos, de asma e bronquite, favorecendo gripes e agravando doenças respiratórias e cardíacas.
O Biodiesel Metropolitano vem de encontro a esta situação caótica. Com o B20 (adição de 20% de biodiesel), estaremos reduzindo em mais de 10% a emissão de monóxido de carbono e materiais particulados e em 20% os hidrocarbonetos.
É preciso associar as discussões do S10 e do Biodiesel Metropolitano para solucionar definitivamente estes pontos que vão muito além da questão ambiental, sem permitir retrocessos outrora já vividos. Melhorar a qualidade de vida, promover a independência da nossa matriz energética e o avanço da agricultura familiar estão entre os benefícios apresentados pelo biodiesel.
Vamos então avançar rumo ao combustível do futuro, olhando em direção ao amanhã, valorizando a vida e o meio ambiente, consolidando nosso país numa posição de destaque na nova ordem energética mundial.
* Juan Diego Ferrés é Presidente do Conselho Superior da União Brasileira do Biodiesel – Ubrabio. A entidade atua como interlocutora do governo em nome da cadeia produtiva do biodiesel.