MARK LUTES, DO WWF

A navegação está no coração da economia globalizada. De acordo com a Câmara Internacional da Navegação, esse setor é responsável pelo transporte de mais de 90% de tudo o que é comercializado no planeta. Também é um peso-pesado nas emissões de gases de efeito estufa: se fosse um país, o transporte marítimo seria o sexto maior emissor do mundo, com mais de 2% do total global.

Para alcançarmos o objetivo do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 1,5oC, precisaremos imediatamente dar escala a ações de redução de emissões, e descarbonizar completamente a economia global em 2050. A navegação não pode ficar para trás nesta corrida por um mundo de carbono zero.

Negociadores de mais de uma centena de países estão reunidos nesta semana em Londres para decidir sobre uma estratégia inicial para lidar com as emissões de gases de efeito estufa desse setor. Se aprovado, será o maior acordo de clima multilateral desde que o Acordo de Paris entrou em vigor, em 2016.

Um acordo bem-sucedido teria de estar alinhado com a meta de 1,5oC, o que significa mirar na descarbonização do setor de navegação em 2050, com ações de curto e médio prazo e metas alinhadas com o objetivo maior. É isso o que propõe um grande grupo de países, incluindo pequenas nações insulares, as mais ameaçadas pela elevação do nível do mar, e muitos outros países desenvolvidos e em desenvolvimento.

As emissões da navegação internacional não estão incluídas nas metas de cada país e, como as da aviação internacional, são de responsabilidade de uma agência especializada da ONU. No caso, trata-se da IMO (Organização Marítima Internacional), cujo Comitê de Proteção Ambiental Marinha tem trabalhado para desenvolver uma estratégia para controlar as emissões de gases-estufa desse setor.

Um grupo de nações insulares, incluindo as Ilhas Marshall, Tuvalu, Fiji, Kiribati, Vanuatu e muitas outras, cuja própria existência está ameaçada pela elevação das temperaturas e do nível do mar, está insistindo em medidas fortes e nas metas necessárias para limitar o aquecimento a 1,5oC, incluindo a possibilidade de descarbonização total em 2050. Para isso, as ações precisam começar já, e metas de curto e médio prazo também são essenciais.

No entanto, alguns países se opõem a adotar qualquer meta absoluta de corte de emissões, e defendem adiar tais metas por mais cinco anos, quando dados mais precisos estiverem disponíveis. Tal atraso daria à indústria da navegação e ao mundo um sinal de que não há urgência em reduzir emissões, e poderia contribuir para colocar o objetivo de 1,5oC fora de alcance.

Vários estudos também mostraram que já existem tecnologias para descarbonizar o transporte marítimo, e que a transição para uma navegação carbono-neutra acelerou dramaticamente desde Paris. Navios movidos a bateria já estão em operação em rotas curtas. Combustíveis alternativos de emissão zero já estão disponíveis, e combustíveis sintéticos como hidrogênio e amônia podem ser rapidamente escalados à medida que caem os custos de energias renováveis, como solar e eólica. Os custos de descarbonizar o transporte marítimo podem estar dentro dos limites de flutuação dos preços dos combustíveis fósseis na última década.

O WWF pede à IMO que adote uma estratégia provisória que sinalize um esforço para descarbonizar completamente a economia em 2050 e comece a agir imediatamente nesse sentido. Na nossa visão, o acordo climático deve ter três elementos essenciais:

O compromisso de buscar a descarbonização completa do setor de navegação em 2050;
A busca imediata de ações ambiciosas e metas de médio prazo de redução de emissões que ponham o setor numa trajetória de descarbonização;
A consideração de medidas para endereçar os impactos desproporcionais que possam ser demonstrados sobre países em desenvolvimento, em especial países menos desenvolvidos e pequenas ilhas, que não reduzam a ambição e a integridade ambiental de metas e medidas de redução de emissões.
Se a IMO e o setor de navegação agirem certo, poderão chamar a si próprios com justiça de líderes, e guiar a corrida rumo a um mundo de zero carbono. Isso criaria um precedente importante para ações coordenadas por parte de outros setores da economia global.

Mark Lutes é Conselheiro Global de Política Climática do WWF.

Mark.lutes@wwf.panda.org

Fonte: Observatório do Clima