Autorizada desde 2010 pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e regulamentada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a mistura obrigatória vigente hoje no Brasil é de 5% de biodiesel adicionado ao diesel fóssil (B5). Em paralelo a este percentual, a mistura B20 (20% de biodiesel adicionado ao diesel fóssil) já é uma realidade para frotas de transporte coletivo em capitais como São Paulo e Rio de Janeiro. Sobre o possível aumento da mistura de biodiesel, a diretora-geral da ANP, Magda Maria de Regina Chambriard, afirmou que não há problemas técnicos. “Tecnicamente a ANP não vê nenhum empecilho”, disse.

A qualidade do biodiesel comercializado no país é estabelecida pela Resolução ANP nº 14/2012. De acordo com a Agência, ao longo de 2010 e 2011, além da recente revisão da especificação, várias ações foram tomadas “a fim de garantir a qualidade do combustível ofertado ao consumidor final, incluindo realização de seminários, criação de grupos específicos de trabalhos publicação de guia contendo informações sobre as boas práticas de manuseio e armazenamento do diesel B”, informou a assessoria. Segundo a ANP, a partir destas ações, foi possível observar a considerável melhoria na qualidade do biodiesel comercializado no país.

A Agência destaca que é importante que o mercado de biodiesel nacional não estacione. E para garantir a qualidade e o desempenho de misturas maiores que 5% de biodiesel adicionado ao diesel fóssil, a ANP publicou as Resoluções 18/2007 e 02/2008, que definem diretrizes para o “uso especifico e experimental do B100 (100% biodiesel) e suas misturas com diesel em teores diversos do autorizado por legislação especifica.”

“Após testes autorizados pelos referidos regulamentos, considerando o respeito às boas práticas de manuseio e armazenamento quando se lida com biodiesel, bem como o ganho ambiental que se pode obter, não foram observadas diferenças significativas no desempenho dos veículos das frotas que utilizam B20 em relação ao B5. Esses resultados são satisfatórios, na medida em que podem subsidiar, do ponto de vista técnico, o estabelecimento de políticas sobre o tema pelo CNPE”, afirma a ANP.

Testes e resultados
Veículo abastecido com B20

No relatório “Biodiesel B20 – O Rio de Janeiro anda na frente” (2011), divulgado pela Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (FETRANSPOR-RJ), constam resultados da experiência realizada com cinco ônibus de três diferentes empresas que rodaram entre novembro de 2009 e janeiro de 2011 utilizandoa mistura B20. Os veículos rodaram um total de 401.766 km e aação foi monitorada pela ANP,BR Distribuidora, Shell, Ipiranga, Mercedez Benz, Man SE (Maschinenfabrik Augsburg-Nürnberg), Instituto Estadual do Ambiente (INEA) e a Prefeitura do Rio de Janeiro.Segundo o professor da UFRJ, Ph.D e consultor técnico da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene – Ubrabio, Donato Aranda, “O relatório mostra que, em todas as empresas observou-se uma redução significativa dos níveis de opacidade das emissões.”

Ao término destes testes, a empresa Mercedes Benz emitiu um relatório de inspeção dos veículos declarando que “Nenhum problema que impeça a utilização do B20 foi identificada”. Segundo Donato, em termos de consumo de combustível, observou-se uma média de 1% de ganho global, sinalizando o B20 como mais econômico.

Na capital paulista, o“Programa Ecofrota” circula com 2000 veículos de transporte coletivo abastecidos com a mistura B20. “O Programa é uma experiência de sucesso querepresenta ganhos ambientais e pode ser aplicada em grandes centros urbanos”, explicaPaulo Mendes, presidente da empresa B100 Energy, associada à Ubrabio e parceira da Viação Itaim Paulista (VIP) e da Prefeitura de São Paulo no Programa.Ele afirma que a utilização do biodiesel melhora, inclusive, o desempenho dos veículos.

“Em nosso caso utilizamos o óleo diesel S50, que possui menor teor de enxofre (menos enxofre, menos lubricidade) e o biodiesel que, por ter uma concentração de cetano elevada, equilibra a lubricidade do combustível. Essa combinação transforma o biocombustível em um Diesel Podium de última geração,aliado ao beneficio antidestringente do biodiesel, que mantém todo o sistema de injeção completamente limpo.”, explica o presidente da B100 Energy. O diesel S50 é obrigatório no sistema de transportes urbanos de São Paulo, de acordo com a Resolução 315/02 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama),órgão consultivo e deliberativo do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), do Ministério do Meio Ambiente.

Paulo Mendes afirma ainda que os veículos do Programa já rodaram com uma mistura maior que B20 e que não houve alterações de desempenho nos ônibus da Ecofrota. “Chegamos a rodar 150.000.000km com uma mistura maior que B20: utilizamos 30% de biodiesel adicionado ao diesel fóssil sem nenhum problema”, comenta. Sobre a opção de continuar com a mistura B20, ele completa:“Optamos por manter os 20% de biodiesel porque o ganho ambiental só teria resultados satisfatórios se nossos veículos estivessem equipados com catalisadores para reter o NOx(óxidos nitrosos), que aumenta com uma mistura maior que 20%.”

Este gargalo já foi solucionado. Para a utilização do diesel S50, a indústria automobilística precisou de uma reconfiguração. Com a tecnologia diferenciada, todos os veículos de série fabricados a partir de 2012 vêm equipados de fábrica com o catalisador que retém o NOx.

Nos Estados Unidos, dados fornecidos pela Agência Ambiental United States Environmental ProtectionAgency e pelo California Air ResourcesBoard mostram que, em comparação ao diesel fóssil, o B20 reduz significativamente as seguintes emissões: 11% menos CO (monóxido de carbono), 12% menos CO2, 13% menos poliaromáticos, 50% menos poliaromáticos nitrogenados, 10% menos hidrocarbonetos promotores de ozônio, uma variação estatística de -2 a +2% de NOx  e 12% menos de material particulado.

A queima do diesel fóssil resulta também em complicações à saúde humana. Dados do estudo apontam que, na Califórnia, estado mais populoso dos EUA, o material particulado de diesel fóssil é responsável por três mil mortes prematuras, aumento de 70% do risco de câncer, 2700 casos de bronquite e cerca de 4400 internações hospitalares por ano, representando um custo de cerca de US$ 21.5 bilhões/ano para o governo americano.

O presidente do Conselho da Ubrabio, Juan Diego Ferrés, destaca que a utilização do biodiesel é um importante ganho social. “Sustentabilidade, geração de emprego e renda com inclusão social e melhoria na saúde da população e na qualidade do ar são exemplos claros de alguns dos principais benefícios agregados ao uso do biodiesel”, afirma. O estímulo à agricultura familiar, fortalecido pelo Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) sinaliza a importância socioeconômica e ambiental de ampliar a mistura obrigatória para 7%, chegando a 10% em 2014. “O Marco Regulatório que estabeleceu a mistura de 5% do biodiesel no diesel fóssil apresentou resultados fantásticos. Não há porque o governo não avançar neste processo. É preciso investir e ampliar a visão e o alcance do PNPB”, conclui Ferrés.