Artigo publicado no Jornal Valor Econômico no dia 05/05/2010.
Biodiesel: a necessidade de um novo marco regulatório
* Juan Diego Ferrés
O ano começou remarcando o sucesso do Programa Nacional de Produção de Biodiesel. A decisão em antecipar para este ano a mistura obrigatória de 5% de Biodiesel ao diesel – o B5 – comprova os benefícios desse biocombustível para a sociedade e a consolidação do seu setor produtivo, seja pela da capacidade de produção, dos investimentos tecnológicos, da segurança e dos demais potenciais dessa indústria.
É possível avançar ainda mais. São produzidos hoje para o B5 2,4 bilhões de litros, mas a capacidade total é 4,6 bilhões, suficiente para atender até um B10, sem prejuízo às outras iniciativas, como o B20 Metropolitano. Dados da ANP mostram que temos 64 usinas em operação e várias em processo de ampliação e instalação.
É grande a distância entre capacidade de produção e volume passível de comercialização, levando a índices insustentáveis de ociosidade. É preciso consolidar o mercado consumidor e conferir vazão a esse potencial que já faz do Brasil o segundo maior produtor de Biodiesel do mundo.
O governo acertou no início desse processo. No entanto, após o B5 não há qualquer marco regulatório previsto para o aumento do percentual. Para mudar isso é preciso alterar a lei 11.097/05.
Uma das alternativas seria o incremento trimestral de 1%, mantendo o gradualismo que garante a segurança na distribuição. Além disso, o B20 Metropolitano, que melhora a qualidade do ar nas grandes cidades, paralelamente com medidas que viabilizem as exportações, com quebra de barreiras tarifárias ou adoção de políticas compensatórias, poderão agregar escala e produtividade, reduzindo o custo futuro de produção do Biodiesel.
A evolução para percentuais mais elevados da mistura torna-se urgente e indispensável para potencializar os efeitos benéficos do Biodiesel. Além de deixar o ar livre de gases nocivos à saúde, no que se refere às mudanças climáticas é mais um passo para a sustentabilidade da nossa matriz energética.
O Biodiesel Brasileiro recebeu da Agência Americana de Meio Ambiente (EPA) o reconhecimento de evitar 57% das emissões de carbono. Um trunfo para o Brasil, que coloca o Biodiesel no Pódium Global dos Biocombustíveis renováveis da atualidade.
No aspecto social, fortalece a agricultura familiar, aproveitando as aptidões regionais, apoiando culturas alternativas. O objetivo é estimular a produção de novas oleaginosas em áreas até então pouco atrativas à agricultura, como é o caso do semiárido.
Para isso o Governo criou o Selo Combustível Social, que promove a inserção da agricultura familiar e sua participação indireta nos grandes leilões. Hoje, mais de 30 usinas compram matéria prima do pequeno produtor e disponibilizam a ele assistência técnica, sementes, entre outros.
Segundo o MDA, a cada 1% de Biodiesel são criados 45 mil empregos provenientes da agricultura familiar, gerando renda de cerca de R$ 5 mil por agricultor.
Um novo marco regulatório beneficiará também o mercado da soja no país. Se apenas o incremento de 10,5 milhões de toneladas previsto para a safra 2009/2010 fosse esmagado, já teríamos disponibilidade de óleo para dobrar de B5 para B10.
Hoje, quase metade da soja é exportada in natura e junto com ela vão as oportunidades de geração de divisas e empregos. Com o B10, parte dessa exportação ficará no Brasil para ser usada pela indústria, gerando postos de trabalho e riquezas.
Além disso, afasta-se a possibilidade da “crise da abundância” – quando não há mercado suficiente para o aumento da produção e a queda dos preços cria um impasse na remuneração dos produtos agrícolas. O B10 traria tranqüilidade aos agricultores e o setor esmagador resolveria sua alta ociosidade.
Cai por terra também a teoria de competição entre alimentos e biocombustíveis. Vale dizer que para cada litro produzido resulta em quatro vezes mais proteína utilizada como ração animal e que volta para o homem em forma de carnes e lácteos, além de parcela crescente de proteína processada diretamente pela indústria de alimentação.
Não deveriam surpreender eventuais críticas tão naturais ao ambiente democrático, mas sim, o constrangimento com que alguns técnicos do governo tentam respondê-las.
Dois pontos desse desconforto são tão visíveis quanto injustificáveis. O primeiro aponta a preponderância da soja dentre as matérias-primas, em contraposição à diversificação gradual e progressiva.
Com isso, o governo deixa de festejar e, pior, o País deixa de aproveitar da melhor forma uma das grandes riquezas da Nação. A soja, que mereceu investimentos nos últimos 40 anos, tem no Biodiesel a oportunidade de concretizar, nos próximos anos, sua segunda revolução.
Constatados os efeitos incomensuráveis da sua primeira revolução e observando as dificuldades óbvias enfrentadas pelo governo no desejo de ver acelerado o desenvolvimento das novas cadeias de produção, deveríamos vencer os preconceitos e reformular conclusões para captar esses benefícios potenciais, transformando-os em realidade.
O segundo é o custo do Biodiesel como empecilho ao B10. Os grandes fóruns – que analisam com profundidade essas questões – são unânimes ao defender a progressão, considerando as questões econômicas na maior amplitude e abrangência possível, ponderando todos os efeitos diretos e indiretos.
Diante disso restaria indagar: se fosse o contrário, por quais motivos então estaríamos festejando o Sucesso do B5?
Quais desses motivos listariam e que não valeriam para também justificar a superação da barreira do B5 e começar a progredir logo para o B10?
Por essas e outras razões o Biodiesel se mostra cada vez mais como o combustível da oportunidade que o Brasil não pode perder!
* Juan Diego Ferrés, é Presidente do Conselho Superior da União Brasileira do Biodiesel – Ubrabio. A entidade, criada há três anos, atua como interlocutora do governo em nome da cadeia produtiva do biodiesel.