Artigo publicado pelo Jornal DCI no dia 14/09/2010.

A viabilidade do Biodiesel

*Juan Diego Ferrés

Três anos após seu início efetivo, o Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) supera expectativas. O Biodiesel é apontado por respeitadas instituições internacionais como solução economicamente viável e sustentável para melhorar a matriz energética reduzindo a dependência da energia fóssil.

Apesar da descoberta de grandes reservas como o pré-sal, especialistas apontam que as limitações do petróleo não residem apenas na disponibilidade, mas em várias consequências negativas do seu uso, como aquecimento global, mudanças climáticas, poluição, acidentes ambientais e elevados investimentos de alta complexidade para extração.

O Brasil está entre os quatro maiores produtores de Biodiesel do mundo. A antecipação de 2013 para 2010 da mistura obrigatória de 5% de Biodiesel ao diesel fóssil – o B5 – evidencia seus benefícios para a sociedade.

O Presidente Lula anunciou que pretende viabilizar o B8 antes do fim do mandato. E é possível avançar mais. Além dos 2,4 bilhões de litros produzidos, temos capacidade anual para mais 2,6 bilhões de litros, o suficiente para atender de imediato até um B10. Índices como estes, que antes provocariam certo receio, hoje são muito viáveis.

A preocupação de que o Biodiesel poderia competir com os alimentos não faz mais sentido. A parte utilizada para o Biodiesel, o óleo, resulta do esmagamento de grãos (entre eles a soja), firmando-se como um subproduto da proteína. Usada como ração animal, a proteína (farelo de soja) volta ao consumo humano em forma de carnes, ovos e laticínios. Pode ainda ser utilizada diretamente na alimentação, pois é a única fonte de origem vegetal nutricionalmente completa.

A proteína tornou-se produto principal, atendendo à crescente demanda por alimentos consolidada nos países emergentes.

O Biodiesel é nova destinação sustentável para um produto que estava limitando o crescimento das produções de oleaginosas, já que o consumo de óleos comestíveis cresce muito abaixo da procura pelos demais alimentos.

Relatório do Banco Mundial esgota as dúvidas em relação ao tema. A pesquisa ressalta que as matérias-primas para produção de biocombustíveis representam apenas 1,5% da área plantada com grãos e oleaginosas no mundo. Mostra ainda que a inflação dos alimentos em 2008 teve total relação com a elevação do preço do petróleo.

O Banco Mundial reforça o Biodiesel como alternativa renovável, que potencializa a oferta de alimentos. Cada litro de óleo resulta em quatro vezes mais proteína destinada à alimentação.

A Agência do Meio Ambiente dos Estados Unidos (EPA) reconhece que o Biodiesel brasileiro evita 57% das emissões de carbono. Outras pesquisas da própria EPA mostram aspectos da qualidade do ar atestando que o Biodiesel Metropolitano – B20 – nos grandes centros urbanos levaria à redução de cerca de 30% dos poluentes. Isso representaria, no Brasil, mais qualidade de vida e saúde às pessoas.

Hoje, o Brasil registra cerca de quatro mil óbitos por ano em razão de doenças cardiovasculares e respiratórias causadas pela poluição (dados da USP), problemas agravados nesses meses de clima seco. Diminuir a poluição veicular e melhorar a qualidade do ar passou a ser urgente.

Em 2009, internações por complicações cardiovasculares atribuídas à poluição custaram cerca de R$ 700 milhões aos cofres públicos, segundo o Ministério da Saúde. E 2010 poderá ser ainda pior!

Nessa abrangência, o Biodiesel resulta mais barato ao Brasil e, por que não dizer ao mundo, já que contribui também para mitigar um dos mais graves desafios à humanidade: o efeito estufa e as mudanças climáticas, com agravamento de catástrofes meteorológicas.

O Brasil nunca importou tanto diesel. Foram 3,8 bilhões de litros apenas no primeiro semestre, comprometendo 3,2 bilhões de dólares em divisas no período, ou seja, a um custo por litro maior que o preço médio do diesel refinado no país, e pior, podendo ter sido substituído por Biodiesel nacional, hoje, de menor custo.

O Biodiesel estimula ainda a agricultura familiar, aproveitando as aptidões regionais das famílias que vivem da terra, apoiando culturas de novas oleaginosas em áreas até então pouco atrativas à agricultura. Expectativas do MDA dão conta de que até o final de 2010 mais de 100 mil famílias estarão inseridas no PNPB.

O uso da soja, além de importante porque era inicialmente a única alternativa para viabilizar o PNPB, estimula novas cadeias, com oferta de outros óleos e subprodutos. São muitas oportunidades de renda aos trabalhadores de todo o Brasil, como um verdadeiro “pré-sal do interior”.

A soja capta o nitrogênio do ar e o fixa no solo, evitando a necessidade da fertilização nitrogenada importada e contribuindo para diminuir as emissões de carbono na cadeia de fertilizantes.

Quase metade da soja brasileira é exportada in natura, levando embora, além do óleo, empregos e divisas. Se parte dessa exportação ficasse aqui para ser beneficiada pela hoje ociosa indústria de esmagamento, muitos postos de trabalho e riquezas seriam gerados no Brasil.

Era esperado que a diversificação de matérias-primas fosse gradual. Afinal, toda cadeia precisa de tempo para se consolidar, a exemplo da soja ao longo de mais de 40 anos. Em 2008, foram produzidos um bilhão de litros de Biodiesel quase exclusivamente a partir da soja. O aumento da produção para os atuais 2,4 bilhões de litros por ano reduziu a participação da soja para 80%. Assim, em apenas dois anos, registramos considerável progresso na diversificação.

Vivemos oportunidade única para iniciar a progressão para o B10, multiplicando esses benefícios e retendo seus efeitos positivos. Introduzindo já o B8 no Marco Regulatório conforme anunciou, o Presidente Lula estará coroando a iniciativa que, pela marcante intuição que lhe é característica, teve visão e coragem de começar há sete anos. Estará pavimentando o caminho para seu sucessor consolidar o B10 e o B20 Metropolitano.

O PNPB representa futuro promissor para o nosso país e iniciativa exemplar, brasileira, para o bem da humanidade.

*Juan Diego Ferrés é presidente do Conselho Superior da União Brasileira do Biodiesel – Ubrabio. Criada há três anos, a entidade atua como interlocutora do governo em nome da cadeia produtiva de Biodiesel.